sábado, 3 de novembro de 2012

REVISTA ÉPOCA: Imperdível !!!

Cid Gomes: "Lula não foi correto conosco"

A eleição deixou graves sequelas na relação do PSB com o PT. Ainda assim, o governador cearense quer que seu partido apoie a reeleição de Dilma

FELIPE PATURY
NUM CRESCENDO O governador Cid Gomes, do Ceará. “Nosso objetivo é ganhar espaço, e estamos conseguindo” (Foto: Jarbas Oliveira/ÉPOCA)
 
A mágoa do PSB com o PT é mais visível no Ceará do que em qualquer outro estado. O governador Cid Gomes elegeu o desconhecido sanitarista Roberto Cláudio como prefeito de Fortaleza. Derrotou o candidato da prefeita Luizianne Lins (PT), aliada convertida em desafeto, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, até então considerado imbatível no Nordeste. Foi uma vitória amarga para Cid e seu irmão Ciro, aliados de primeira hora do PT. Filhos de um defensor público e uma professora, eles não esquecem as acusações de ser oligarcas, coronéis e de só se importar com pobres na hora da eleição – esta última feita por Lula. Mesmo decepcionados, Cid diz que ele e Ciro apoiarão a reeleição da presidente Dilma Rousseff em 2014.
 
ÉPOCA – O PSB venceu o PT em todas as disputas importantes de que participou nesta eleição: Belo Horizonte, Recife, Fortaleza e Campinas. O PT subestimou seu aliado histórico?
Cid Gomes –
Não enxergo nisso uma rivalidade ou uma má relação. O PT é nosso aliado nacional. O que não se pode é achar que somos satélites do PT. Não somos. Temos um projeto de poder próprio.
 
ÉPOCA – O senhor está falando da Presidência da República?
Cid –
Estou, sim, e digo, para que não me interpretem errado: defendo o apoio à reeleição da presidente Dilma Rousseff em 2014. Apoiamos a Dilma em 2010, tivemos um papel importante na eleição dela, participamos de seu governo, e ela vem fazendo uma boa gestão. É natural que apoiemos sua reeleição. Nosso projeto de Presidência deve vir depois.
ÉPOCA – O PSB compartilha sua opinião?
Cid –
Não posso dizer. O partido não deliberou sobre o assunto. Posso dizer que (o presidente do partido e governador de Pernambuco) Eduardo Campos declarou que a eleição de 2014 deve ser tratada em 2014.
 
ÉPOCA – Então, Campos pode disputar o Planalto em 2014?
Cid –
Acho que ele deve aguardar 2018. É verdade que Eduardo é um grande quadro, bem preparado e o governador mais popular do Brasil. Também é claro que o PSB foi o partido que mais saiu fortalecido das urnas. É o que mais tem prefeitos de capitais, e capital é muito importante. Governa quase metade da população do Estado. Agora, eleição municipal é uma questão local. Não enxergo seus efeitos no plano estadual, muito menos no nacional. O PSB deve apoiar a reeleição de Dilma e, em 2015, devolver os cargos que tem no governo federal. Sem isso, será difícil mostrar a diferença entre nossa forma de governar e a deles. Não faz sentido e não é correto participar do governo de outro partido e, depois, lançar candidatura contra esse mesmo partido.
ÉPOCA – O que o PSB ganha esperando até 2018?
Cid –
Nosso objetivo é ganhar espaço e estamos conseguindo. Fomos dos poucos partidos que cresceram nesta eleição. Em 2010, fizemos seis governadores. Ainda temos deficiências. Embora isso não seja pré-requisito para ganhar a Presidência, nossas bancadas de senadores e deputados são pequenas.
"É possível que não haja nenhum Ferreira Gomes na política em 2015. Não quer dizer que estejamos largando a vida pública. Vamos só dar um tempo"
 
ÉPOCA – Em comício do ex-presidente Lula em Fortaleza, o senhor e seus irmãos foram chamados de oligarcas e acusados de só se lembrar dos pobres em tempo de eleição. Como o senhor se sentiu?

Cid –
Foi uma agressão e uma agressão injusta. Quem esteve com Lula nas horas decisivas fomos nós. Na eleição de 2002, (a prefeita de Fortaleza) Luizianne (Lins) e (o candidato petista) Elmano de Freitas vaiaram Lula em praça pública, porque ele escolheu o José Alencar para vice. No segundo turno daquela eleição, Ciro (que disputou o primeiro turno) não pestanejou e declarou apoio a Lula. Em 2005, no mensalão, parte do PT se escondeu. Outra falou em pós-Lula. Nós fomos à linha de frente defendê-lo. Os votos responsáveis pela reeleição dele vieram daqui. Fomos para a linha de frente na eleição de Dilma. Lula não foi correto conosco.
ÉPOCA – Ingrato é uma palavra mais precisa?
Cid –
Digo que não foi correto. Antes da eleição, disse a Lula: “Ou a gente encontra um nome capaz de inspirar um sentimento de renovação ou será muito difícil para mim”. Eu queria manter a aliança, mas com outro candidato. Lula disse que era possível e me daria uma posição. Nunca me procurou. Entendi que me deixava à vontade para que o PSB lançasse Roberto Cláudio. Não seria um excesso de gentileza se tivesse me ligado para dizer: “Desculpe, estou sofrendo muita pressão para ir a Fortaleza”. Vindo aqui, faria a defesa de seu candidato sem acusar ninguém. Entendo isso. Também sofro pressões do PSB para bater nos outros partidos. Não é preciso agredir para defender o que se acredita.
 
ÉPOCA – O PT só ganhou a eleição numa das nove capitais do Nordeste. Lula foi o grande derrotado?

Cid –
Não colocaria assim. O PT tinha duas capitais na região: Fortaleza e Recife. Foi mal nas duas administrações. Aconteceu o mesmo com gestões mal avaliadas de outros partidos. Em Natal, a prefeita (Micarla de Souza, do PV) nem concorreu. Em São Luís, o prefeito do PSDB (João Castelo) perdeu. Em Teresina, o do PTB (Elmano Férrer) também. Lula ganhou a eleição onde ele teve o cuidado de ter um bom candidato, como em São Paulo. Aonde ele foi por solidariedade ao PT ou por sentimento de dívida perdeu. As pessoas foram sábias. Distinguiram essas situações e escolheram o que era melhor para seu município.
 
ÉPOCA – Como agiu a presidente Dilma?

Cid –
De forma republicana. Não tenho reparo a fazer. Pelo contrário, só tenho reconhecimento pela atitude dela. Quando acabou o primeiro turno, disse isso a ela. No segundo turno, agradeci novamente. Ela respondeu: “Não poderia ter outra postura, você me apoiou”. E ainda me pediu o telefone do (prefeito eleito) Roberto Cláudio.
 
ÉPOCA – Lula também telefonou para o senhor?

Cid –
Não.
 
ÉPOCA – O que o senhor pretende fazer em 2014?

Cid –
Cumprirei meu mandato até o último dia. Não disputarei eleição em 2014. Depois, passarei mais tempo com minha família. Vou trabalhar no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em Washington. Pedi ao presidente Luis Alberto Moreno: “Meu desejo é trabalhar com o senhor”. Ele respondeu: “Não se preocupe, meu filho”. Então, eu vou.Quando voltar ao Brasil, avaliarei se disputarei outra eleição. O melhor dos mundos é sair da política sem ser expulso. Sair como saiu o Pelé: por cima.
 
ÉPOCA – O senhor está abandonando a vida pública?

Cid –
Não, essa é minha vocação. Ter mandato não é a única forma de servir. O objetivo do BID é reduzir a desigualdade, melhorar a vida das pessoas, desenvolver as Américas.
 
ÉPOCA – O senhor pensa em pedir à presidente Dilma para nomeá-lo representante do Brasil no BID?

Cid –
Desculpe, estou rindo porque essa pergunta me coloca numa situação constrangedora. Quanto maior seja meu espaço, tanto mais eu possa atuar, melhor. O Brasil tem um vice-presidente lá. Se eu puder ser esse vice, melhor.
 
ÉPOCA – Se o senhor ficar no cargo até o último dia do mandato, impede seus irmãos Ciro e Ivo de disputar mandatos federais.

Cid –
Enquanto eu estiver no governo, Ciro só pode disputar a Presidência e a Vice-Presidência da República. Ivo é deputado estadual e poderia ser reeleito, mas diz que não quer mais disputar esse cargo. É possível que não haja nenhum de nós na política em 2015, depois da eleição. Não quer dizer que estejamos largando a vida pública. Vamos só dar um tempo.